Pedro M. Lourenço
A cauda do pavão

Branco. Alvo. Níveo. Cândido. Albino. O albinismo e o leucismo são uma forma aberrante que raramente ocorre na Natureza. Caracterizados pela ausência de melanina, os animais albinos têm uma menor resistência à radiação solar, maior dificuldade em esconderem-se dos predadores e problemas oculares. A Natureza faz assim questão de eliminar o branco da sua paleta excepto em casos muito raros, como os de animais que vivem na neve ou na escuridão de grutas profundas. Já o homem valoriza tanto a raridade que selecciona activamente animais brancos, que podem ser tão banais como um ganso branco ou tão desconcertantes como um fantasmagórico pavão branco.
O pavão branco, quando macho, conta-nos outra história idêntica de preferência pela aberração. A cauda do pavão, o epíteto do absurdo no mundo animal, é tanto um monumento à beleza radiante da vida como uma recordação viva da intransigência da fêmea. Essa intransigência condena os pavões macho a arrastar consigo uma cauda descabida de sentido, que lhes dificulta os movimentos e os obriga a um esforço constante de equilíbrio e força só para se susterem nas patas. Contudo, para o pavão macho este é um esforço meritório. O macho mais exuberante irá conquistar o maior número de fêmeas e deixar um maior número de descendentes, também eles condenados a sofrer pela sua beleza.
O homem e a fêmea de pavão levam ao extremo a máxima que nos diz que a beleza está nos olhos de que a vê. Dispostos a enfrentar os ditames das leis da Natureza, ambos levam os objectos do seu fascínio a abandonar a norma e deixar para trás a fronteira da normalidade, para se tornarem meros objectos de admiração.